14.6.07

 

Ota, ameijoas e mulheres (RPS)

Mal se conheceu a decisão, uma manhã destas, Arlindo do Rêgo enviou-me, via sms, a sua análise:

Pausa de seis meses na Ota. Balão para Costa subir e estabilizador anti-turbulência para a presidência europeia de Sócrates. A arte de explorar a retirada provisória.

Desenvolve, no dia seguinte, a sua tese, frente a mim, à mesa, enquanto aviamos as desejadas ameijoas à Bulhão Pato. O empregado pergunta se é das brancas, do Algarve, ou da mais escura. Interrogamo-nos mutuamente, com o olhar, encolhemos os ombros em simultâneto e, com sentido prático, ela manda vir uma de cada.

Acabamos por verificar que ele prefere a branca, a do Algarve, eu a mais escura. Do norte, segundo o empregado. Só no fim, ao ver a conta, notamos que umas custam o triplo das outras. As dele, claro, porque a Natureza fez de Arlindo um homem de gostos caros. Não tivesse ele Ebnezer Scrooge como modelo – “meu ídolo e meu irmão” - estaria mesmo desgraçado.

Encontro-o lúcido, como sempre, mas estafadote, como ele costuma dizer. Ferrou-se-lhe uma constipação, visível no ar congestionado e expressa na libertação de miasmas. Sossega, contudo, à medida que a refeição o (nos) conforta. Queixa-se do excesso de trabalho e das preocupações com o trabalho. Noto-o angustiado face à perda iminente do seu braço-direito.

Enquanto aguardamos pelas lulas grelhadas, a conversa desemboca na temática feminina. Desta vez, não propriamente num registo primário e brejeiro, mas num menos frequente registo sério. Não falamos "de gajas", mas de relacionamentos. Arlindo entra num campo em se multiplicam as minhas incertezas. Um campo em que não consigo formar opiniões definitivas.

Ele fala-me da impossibilidade de uma relação poder ser duradoura e boa (ou feliz). Diz que "a partilha permanente da intimidade estraga tudo" e argumenta: "por isso é que as amizades podem ser perenes".

Arlindo elogia, entretanto, a sageza de um amigo comum pelo facto de, ao longo da vida, de cada vez que se relacionava intimamente com uma mulher "pegar nos tarecos e meter-se em casa dela". Estava sempre em vantagem, sustentou ele, porque quando a coisa acabava "pegava nos tarecos e vinha-se embora nas calmas".

Aludo ao modelo "vida a dois em casas separadas". Não, diz ele, definitivo. Hesita, depois: "só se for no mesmo prédio e no mesmo patamar". Conclui: "o quarto não é importante, mas a casa é".

Levei-o a casa e agendamos para quinta-feira, em Espinho, "com a malta toda". É daqui a pouco. Vou embora.

Comments:
Esse seu amigo, RPS, que já apelidou de LÚCIDO, também é SÁBIO. Se a minha modesta opinião pode contar.
Há aí matéria que "dá pano para mangas"!
 
Ameijoas? Lulas?
Ainda bem que eu não fui a esse jantar.
Fui mais esperto. Empanturrei-me com um belo Big Mac sem queijo.
 
... ameijoas a bulhao pato! Isso é que marchava!

cada vez gosto mais do teu amigo Arlindo.

Bjicos
 
"Arlindo elogia, entretanto, a sageza de um amigo comum pelo facto de, ao longo da vida, de cada vez que se relacionava intimamente com uma mulher "pegar nos tarecos e meter-se em casa dela". Estava sempre em vantagem, sustentou ele, porque quando a coisa acabava "pegava nos tarecos e vinha-se embora nas calmas".

É uma grosseira mentira, esta do Arlindo. Nunca peguei nos tarecos para me meter em casa delas. Limitei-me a meter-me em casa delas. Sem tarecos.
 
:)
 
É engraçado o conceito de só haver tarecos para pegar e ir-se embora.
Isso é o Paraíso perdido.
Tanto homens, como mulheres, no fundo, sem terem coragem de o assumir, é o que desejam, sonham.

Nem sempre a "partilha permanente estraga tudo" é só necessário ser-se tão orgulhoso, tão vice-deus como o Funes.
Se, se for deus, já é, bem capaz, de estragar tudo.
 
Nada melhor do que uma boa conversa com um bom amigo, certo?
 
Este comentário foi removido pelo autor.
 
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