12.10.05

 

Autárquicas IV - ou uma explicação sobre a estratégia do isto está a crescer (RPS)

Durante uma campanha eleitoral, um partido ou um candidato que se sente em dificuldades, em desvantagem, recorre normalmente a uma estratégia que pode ser designada como a estratégia do isto está a crescer. A frase terá conotações brejeiras, mas é reproduzida em tom sério pelos responsaveis partidários e/ou das campanhas. Principalmente junto dos jornalistas.

O objectivo é tentar fazer crer a toda agente - ao(s) candidato(s), aos apoiantes, à própria militância, aos jornalistas e, através destes, à opinião pública - que se verifica uma real inversão de tendência do eleitorado e que a vitória é, afinal, bem provável.
Acontece com todos os partidos. Senti isto directamente na campanha do PS e de Ferro Rodrigues, nas Legislativas de 2002. E verificou-se, agora, nas Autárquicas, com a campanha do PS no Porto.

No caso da campanha de Francisco Assis (um tipo que me merece consideração), a estratégia foi lançada da forma mais comum: à entrada do último fim de semana, a entourage do PS começou a falar da existência de sondagens - finalmente! - favoráveis. Não se trata propriamente de informação para difundir, mas para correr boca a boca. Anima e faz aumentar o optimismo da militância, dos apoiantes, dos próprios responsáveis da campanha e do próprio candidato.
A maioria dos jornalistas recebe e interioriza a informação sem a questionar. Nunca nenhum deles viu nem pediu um papel que pudesse, ao menos, dar algum crédito às tais sondagens.

De seguida, a organização aposta forte numas acções de rua, com muita gente. música e animação. Dá-se assim consistência ao optimismo de súbito reinante. É típico, nesta altura, virem os dirigentes juntos dos jornalistas chamar a atenção para a mobilização conseguida. E o jornalista médio - incauto e sem sentido crítico - vai interiorizando o tal isto está a crescer...
As mensagens difundidas pelos diversos órgãos de Comunicação Social começam a ter um tom geral mais positivo. E está para vir aí a grande cartada...

No caso da campanha de Francisco Assis, a cartada foi o comício no Rosa Mota com a presença de José Sócrates ao lado do candidato ao Porto. Lembram-se de como foi dada a notícia pela generalidade de rádios e TVs? Eu recordo-me. Basicamente foi assim:

- numa decisão de última hora, o secretário-geral do PS e Primeiro-Ministro decidiu vir ao Porto apoiar Assis. A deslocação do PM ao Porto NUNCA (!!!!!) esteve prevista e constitui mais um sinal de que a vitória no Porto é bem possível.

Se a generalidade dos jornalistas "comeu" sem se questionar a informação de que se tratava de um decisão sem precedentes e de última hora, mais dificlmente iria questionar as fontes sobre se a vinda de Sócrates ao Porto constituiria, de facto, uma ajuda a Assis ou se não viria antes a revelar-se contraproducente. Eu, no lugar de Assis, dizia ao engenheiro Sócrates para ficar em Lisboa ou ir ajudar outro candidato para outra terra.

De súbito, o comício com Sócrates passou a ser um grande acontecimento. Os relatos, na generalidade da imprensa, falavam num grande comício, numa fortíssima mobilização e num grande discurso de Assis. Associados à intervenção do candidato, ouvi adjectivos como imparável e arrebatador.
Depois de uma semana morna, o tom de todas as crónicas era, de súbito, positivo, optimista e assim se manteve até ao último minuto da campanha.

A campanha terminava ficando no ar a sensação de que a luta no Porto iria ser renhidíssima. Ora, como nas contas finais vemos uma vantagem de 10 pontos do PSD face ao PS, de duas uma: ou significativa fatia do eleitorado passou o sábado a reflectir e mudou de opinião, ou, então, não se verificava qualquer recuperação, muito menos uma viragem, sendo que a Comunicação Social reproduziu uma encenação.

A hipótese válida é a segunda, claro.
O mesmo se passou, por exemplo, em Sintra. A campanha acabou com a "certeza" de que a contagem de votos iria ser renhidíssima. O resultado final mostrou treze pontos de diferença.
Fomos, também, para o dia de reflexão convictos de uma extrordinária subida do Bloco de Esquerda: terceira força em Lisboa, à frente da CDU, e com dois vereadores eleitos. Vereador certinho no Porto. Vereadores eleitos por todo o país.
Os jornalistas têm alguma culpa nisto. Por incompetência e falta de sentido crítico - não por se venderem a A ou a B.
Mas é evidente que há quem tenha boa imprensa e há quem tenha má imprensa. Boa imprensa não garante, contudo, uma vitória. Nem ter má imprensa é necessariamente mau. Acho que falarei disso amanhã.

Comments:
"A estatística é a única ciência em que diferentes especialistas usam exactamente os mesmos dados para tirar conclusões completamente distintas. É uma ciência flexível, feita à medida das necessidades de cada um e construída de trás para a frente. Daí que o primeiro passo em qualquer estudo estatísco seja saber qual a conclusão a que se quer chegar."
é o que diz Jorge Maia em http://www.ojogo.pt/21-234/artigo503933.htm

ainda não sei bem o que dizer sobre esta e a outra posta. é que não há estudos credíveis sobre os efeitos das sondagens na populaça!

e qt à pousta anterior, RPS, podemos dizer que o Expresso está feito com o PS? então quando eles lançam aquelas notícias espatafúrdias quer dizer que estão feitos com alguém, para tramar os outros??
 
Caro Everything... Não sei quem está feito com quem. Acho é que tu tens alguma razão quando falas dos bardinas e dos ardinas. Alguma, aí uns 25 por cento, nas minhas estatísticas.
 
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