13.4.05

 

Hora de Ponta (solta) (dora pê)

Uma lei livre da relatividade diz que o semáforo vermelho dura sempre mais 30 segundos que o verde. Hoje aprendi outra. Que a distância entre o Marquês e o Rossio pode ter um número infinito de semáforos todos vermelhos se fizermos o percurso num determinado táxi da cidade. É amplo e claro como uma igreja. O banco de trás forrado de lençol imaculado, os da frente de plástico transparente. A cada vermelho o condutor virava-se para o lugar do morto, sôfrego, e parecia ler alguma coisa de letras grandes porque folheava com frequência. Só voltava a arrrancar ao som dos impacientes, nunca reagiu à cor verde. Cada abrandamento era pretexto para mais uma paragem debruçado sobre o banco do lado e, a espaços, folheava outra vez. A toque de buzinas lá metia outra vez a primeira. Imaginei tudo sobre quem era e o que poderia estar a ler. Os óculos escuros não reflectiam nada. Alimentei assim a curiosidade, fiz um jogo comigo própria sobre o objecto da leitura que me havia de dizer quase tudo sobre o homem. Quando chegámos paguei sem sequer espreitar para o banco onde parecia estar o mapa do mundo do taxista. Acredito sem provas de contrário de que poderia estar a ler o último livro do Paul Auster . Seria um dos personagens ou um dos autores da história que tinha enviado para o tal programa de rádio. Protagonista dos enigmas reveladores de um país ou de um simples momento na vida. Mas protagonista. Era o perfeito desconhecido.

Comments:
E...
 
...às vezes não há e... quando se trata de pessoas a realidade não é fanática de pontos finais. Pessoalmente, por vezes prefiro reticências. Se tivesse verificado e o homem estivesse a ler "A Bola", por exemplo, nunca mais me lembraria dele. Mas podemos sempre inventar..tipo: e depois veio o lobo mau e apanhou este táxi para a terra do nunca...


 
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