26.3.05

 

Estou quase conformado... (RPS)

Está aí o novo Código de Estrada.

Para “Padrinho Oficial” do novo Código, o governo encontrou a pessoa certa: um jovem-velho secretário de estado, o tal que chorou na tomada de posse. Um tipo de aspecto seboso e boçal. E que se leva a sério de mais – o que lhe augura um grande futuro nos tempos que correm.

O novo Código é um disparate. Não era necessário mudar nem agravar nada. Bastava aumentar a fiscalização efectiva nas estradas e nas vias públicas urbanas (pois é: mais polícia, mais meios... despesa, despesa...) e introduzir a obrigatoriedade de pagamento imediato das coimas (que palavra horrível...) e multas.

Mas, nestes tempos em que reina o espírito do proibicionismo, não há nada a fazer. E eu estou quase conformado. “Quase” porque há um ponto em que, na verdade, não me conformo: isso de obrigar as crianças até aos 12 anos de viajarem amarradas em cadeiras próprias. Na minha infância, passei horas de viagem, juntamente com as minhas irmãs, de joelhos no banco traseiro, voltados para trás, a dizer adeus ao carro que nos seguia. A esmagadora maioria das vezes éramos correspondidos, o que nos fazia sentir verdadeiramente recompensados. Dói pensar que as gerações que aí vêm nunca sentirão o mesmo.

Comments:
agora ficaste velho...

demasiado para te lembrares talvez que quando foi a tua infancia este também era um país infantil. em vez de "auto" as estradas eram caminhos. a única semelhança com os carros de hoje era terem quatro rodas. do porto a lisboa demorava pouco menos que um dia. ter um carro era um luxo de toda a família (e só de algumas) e era suposto durar até haver netos. os portugueses não violavam o código porque não violavam regras e pronto. e sobretudo, nessa altura da tua infancia, as únicas pessoas que conhecíamos com filhos eram os nossos pais e os amigos deles...

ao abrigo do direito de ri"postar"
a vizinha pê (inconformada)
 
"O novo Código é um disparate."

Concordo em absoluto. Sobretudo porque todo ele assenta no axioma peregrino (tão caro a certa modernidade bem pensante) de que as mentalidades se podem alterar por decreto-lei.

Como sempre, a realidade acabará por impor-se às intenções piedosas.

Quando descobrir que as multas proibitivas e pagas na hora, não farão diminuir as infracções, mas aumentar a corrupção; quando descobrir que a carta apreendida na hora não melhorará os níveis de desempenho ao volante, mas fará florescer um rentável mercado de cartas falas, o legislador lá nos brindará com mais uma reforma milagrosa do Direito Estradal. Como sempre, como esta, a última, a definitiva.
 
PORQUE TAMBÉM SE PODE RIPOSTAR AO RIPOSTANÇO...
Querida Dora Pê:
Antes demais - e porque és nova - quero dizer-te que no Portugal de antigamente também se violavam regras. E as de trânsito, obviamente. O meu Pai até dizia algumas vezes "camelo".
Dou de barato que a referência às viagens da minha infância está impregnada de lamechiche, mas isso não retira o essencial. E o essencial está no comment anterior, de Lunes, el memorioso.
Daqui a um ano, veremos os efeitos destas alterações.
Um beijo do teu admirador,
RPS
 
já no campo da lenga lenga...

algumas mentalidades também se mudam por decreto, porque algumas mentalidades não vão lá sem o decreto que lhes mete a mão no bolso ou o esqueleto atrás das grades ou outras coisas previstas na lei como a seguir poderás constatar. não sendo apologista da fórmula tenho que admitir que este é um desses casos.até por falta de alternativas. não me parece que se possa ensinar a alguém com idade para ter carta o direito dos outros a não se arriscarem a ficar aos bocados numa estrada só porque alguém se excita por carregar com um pézinho naquela chapa que é o acelerador.raras foram as matérias que neste país gastaram tanto latim e dinheiro em campanhas. quanto à censura social..estamos conversados. nunca hei-de perceber, pelo menos estou a demorar, porque é que as pessoas que nunca arriscariam a vida para salvar outra - e acho que sou uma dessas - se arriscam a morrer e a matar pelo "prazer" de conduzir de forma perigosa.

sou a prova de que neste país as pessoas se transformam totalmente atrás de um volante, ou seja, sou atinadinha a conduzir. e apesar de toda esta converseta..sim..já..já fui multada, paguei caro e fiquei temporariamente sem carta. fui a tribunal e ao "o que é que tem a dizer em sua defesa" do juiz, respondi "nada, acho muito bem ter sido multada". e acho. moral da história: não mudei a mentalidade, continua a gostar de beber uns copos (como sabes...)e a gostar (embora menos) de conduzir..o tal decreto só me fez mudar a tática do simultâneo. se calhar não me salvou a vida ou a de outra pessoa, se calhar sim.

da pê com carinho..e bora lá dar uma volta..mas conduzo eu.
 
Achei o reparo delicioso! Segurança à parte. Novo código, sem comentários que, como sabes, muito teria para dizer :)
O que de melhor guardo de muitas viagens nessa idade são, seguramente, os acenos para os carros que vinham a trás. E claro, a divina retribuição do ilustre desconhecido condutor.
Mas o "dói pensar que as gerações..." é excessivo, RPS!
Nas cadeiritas, os miúdos podem sempre acenar para o lado! Que isto de querer meter conversa, que é como quem diz acenar ao desconhecido - nesta e noutras idades - não requer posição especial! Tudo vai de começar a acenar... do impulso inicial. E tudo isto só para dizer que achei o texto delicioso!
Boa estada pela capital e
porta-te mal :) Div erte-te.
Beringela
 
Um amigo falou-me do blog e cá vim eu espreitar. Posto aqui porque também me revi nestas viagens de dizer adeus aos outros carros. Mas agora ao ler os posts anteriores, acho o que a beringela diz com imensa graça, pois não é dramático.Msa está giro pensar nessa vertente do Código.
Rute
 
Querida Dora Pê:
no passado dia 23 de Fevereiro, uma juíza fez-me a mesma pergunta, pelos mesmos motivos.
Sim, vamos para os copos. E é óbvio que guias tu porque até Junho incorro em crime de desobediência.
1bj, RPS
 
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